quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

ENTREVISTA COM O AMIGO E COLABORADOR WINTER BASTOS

Por: Fabio da Silva Barbosa e Luiz Henrique Peixoto Caldas

Winter Bastos é escritor, formado em direito com pós em letras e lançou seu primeiro livro. “Malandragem, Revolta e Anarquia” é um estudo sobre três grandes nomes da literatura nacional. João Antônio, Antônio Fraga e Lima Barreto. Esse livro é um trabalho em conjunto com a atriz Nalini Narayam que está participando do filme “Dia de Simulado”, previsto para ser finalizado e lançado ainda esse ano.
O livro foi lançado pela Editora Achiamé e pode ser conseguido nas mais diversas livrarias ou pela própria editora através do endereço: Caixa Postal 50083, Rio de Janeiro, RJ – CEP.: 20062970. Telefax (21) 22082979. E-mail: letralivre@gbl.com.br
Além do livro, Winter ainda se encontra as voltas com o fanzine O Berro e contribui com os blogs comunidadeeditoria.blogspot.com, inversoeaocontrario.blogspot.com, além de diversos outros veículos virtuais e impressos. Foi Professor Universitário e atualmente trabalha no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

Fale um pouco sobre o livro.

Winter: O livro fala sobre três escritores que considero muito importantes para a literatura brasileira. Embora estejam marginalizados na história da nossa literatura, são de grande importância por sua riqueza literária. Mesmo Lima Barreto, que é mais contemplado pela bibliografia universitária, ainda não foi devidamente estudado. Os outros dois então, mal são citados. João Antônio até é citado, mas muito menos que deveria. Antônio Fraga chega a ser um desconhecido apesar de ter renovado a linguagem literária de seu tempo. A ponto de ter sido elogiado por Oswald de Andrade.
Eu queria muito fazer esse estudo porque esses três autores deram voz ao marginalizado aqui no Brasil. E não era uma visão de fora. Não era o outro falando sobre. Tentou-se mostrar a visão desses grupos. O João Antônio, por exemplo, tem um conto chamado “O Guardador”, onde se encontra todo o modo de falar de um guardador de carros. Talvez por essa proposta mais radical eles próprios tenham sido jogados a margem. Quando você fala em marginal você fala de um problema social. Mas a marginalidade também pode ser vista como algo positivo culturalmente, já que certos grupos podem escolher ficar a margem do que é imposto pela regra geral. Da forma como esses autores fazem, ainda não tinha sido feito. Talvez, antes do Lima Barreto, o Manoel Antônio de Almeida tenha conseguido algo parecido no “Memórias de um Sargento de Milícias”. Além desse não me recordo de nenhum outro que mostre a classe pobre do jeito que o Lima Barreto viria mostrar. Com um que de jornalismo misturado a literatura. Nenhum desses três autores foi para a “Academia Brasileira de Letras”. O Lima Barreto se candidatou três vezes à Academia. Na primeira vez a candidatura nem foi considerada. A própria história de vida deles os aproximava mais da vida marginal do que da academia. Eram comportamentos antagônicos.

Como você constrói um trabalho de pesquisa como esse? É uma coisa fácil de fazer?

Winter: Não é fácil. Diria até que é extremamente difícil. Esse livro, por exemplo, foi feito em cima de um trabalho de mestrado, que como todo trabalho do tipo, é feito com um período pequeno para sua conclusão. Temos para isso, no máximo dois anos. A Universidade nos atrapalha com essas exigências de tempo cada vez menor. Eu ainda consegui uma brecha de mais seis meses para entregar essa dissertação.

Então essa obra seria sua dissertação de mestrado?

Winter: Ela nasceu de uma dissertação. Até por isso ela não foi tão prejudicada por essa questão de tempo escasso. Ela foi ampliada e o tipo de linguagem modificada.

Por que a necessidade de modificação no tipo de linguagem?

Winter: Porque agora eu não estava mais escrevendo para quatro pessoas na banca que iriam me dar uma nota. Eu estava escrevendo para qualquer pessoa que quisesse ler. Tirei muitos modismos e vícios acadêmicos. Apesar, já na época da dissertação, de ter usado o mínimo possível dessa linguagem muito acadêmica, o livro desengordurou ainda mais essa coisa, até praticamente sumir. Algumas coisas foram retiradas e outras acrescentadas. O livro ficou com um despojamento que é importante. É até curioso falar em despojamento. As pessoas pensam logo em fazer de qualquer jeito, mas esse despojamento é um despojamento trabalhado. Na verdade, é muito mais fácil falar uma frase difícil, que falar uma frase fácil. Essa aparente frase fácil é fruto de todo um processo que você tem de construir para aquilo ficar o mais natural possível. A difícil já tem aquelas fórmulas... Receitas de bolo para você por em uso e soar como é julgado ser a forma certa... a forma culta. Na escrita funciona assim. Esses autores tratados nessa obra conseguem demonstrar bem isso, já que eles tinham conhecimento necessário para escrever de um jeito convencional, mas preferiram outra coisa. E ainda bem que eles preferiram isso. Caso contrário estariam sendo comentados como qualquer um dos outros que são comentados hoje em dia. Talvez sem nada tão substancial quanto conseguiram fazer.

Qual material você utilizou como referencia na construção desse trabalho?

Winter: “Malagueta Perus e Bacanaço” de João Antônio, “Desabrigo” de Antônio Fraga e “A Nova Califórnia” de Lima Barreto. Essas obras me possibilitaram enxergar essa relação dos autores com a marginalidade. Isso vai se refratar respectivamente na malandragem, representada ali pelo João Antônio, na revolta, palavra chave para entender Antônio Fraga e na anarquia, opção política ideológica de Lima Barreto.

Compensa ser escritor?

Winter: A satisfação de ter uma obra publicada vem de conseguirmos partilhar todo conhecimento que adquirimos com as outras pessoas. Mas não é fácil publicar um livro no Brasil de hoje... Acredito que em outras partes do mundo também não. Nós vivemos em uma sociedade que está voltada para o lucro fácil. Então se você faz uma ficção de digestão rápida, que ofereça apenas um prazer imediato, as editoras vão estar dispostas a conduzir isso. Algo que lhe dá um prazer fácil é de vendagem rápida, mas não revoluciona sua vida. Não trás mudanças reais. O Frans Kafica já dizia que os bons livros nos afetam como um desastre. “Um livro que nos afete como um machado em um mar congelado em nós.” Então o que ele queria era um livro que mexesse com ele. Um livro que ficasse em nossa mente mesmo depois de fechar a última página. O mercado quer lucro certo, não algo que vá gerar uma consciência plena. O importante é perseverar e acreditar na arte. Um bom escritor tem de ler muito. Isso pode parecer um conselho meio obvio, mas hoje em dia é importante que se dê esse conselho obvio, pois as pessoas estão se afastando cada vez mais da leitura e se aproximando de uma cultura meramente televisiva. Uma cultura que nos vai levar cada vez mais para baixo. As pessoas não sabem nada sobre o romance “1984”, mas sabem fofocas do Big Brother. A pessoa conhece esse Big Brother superficial, mas não sabe o que realmente é o Big Brother descrito por George Orwell. Então, em um mundo onde as pessoas estão recheadas desses valores alienantes, nunca é demais dar conselhos como: Leiam muito.